terça-feira, 23 de novembro de 2010

Igreja, sindicatos e direito à greve


A doutrina social da Igreja reconhece a legitimidade da greve «quando se apresenta como recurso inevitável, senão mesmo necessário, em vista dum benefício proporcionado» (Catecismo da Igreja Católica, n.º 2435), depois de se terem revelado ineficazes todos os outros recursos para a resolução dos conflitos.

Segundo o n.º 304 do Compêndio da Doutrina Social da Igreja Católica, “a greve, uma das conquistas mais penosas do associativismo sindical, pode ser definida como a recusa colectiva e concertada, por parte dos trabalhadores, de prestarem o seu trabalho, com o objectivo de obter, por meio da pressão assim exercida sobre os empregadores, sobre o Estado e sobre a opinião pública, melhores condições de trabalho e da sua situação social”.

A carta “Octogesima Adveniens”, escrita em 1971 pelo Papa Paulo VI, ressalva no seu n.º 14 que, no caso dos serviços públicosnecessários para a vida quotidiana de toda uma comunidade, dever-se-á saber determinar os limites, para além dos quais o prejuízo causado se torna inadmissível”.

A “Gaudium et Spes”, constituição pastoral aprovada durante o Concílio Vaticano II (1962-1965), declara no n.º 68 que os parceiros sociais envolvidos numa paralisação devem “retomar o mais depressa possível o caminho da negociação e do diálogo da conciliação”.

A greve, “conquanto se perfile «como […] uma espécie de “ultimato”» (Laborem Exercens, n.º 20), deve ser sempre um método pacífico de reivindicação e de luta pelos próprios direitos; torna-se «moralmente inaceitável quando acompanhada de violências, ou com objectivos não directamente ligados às condições de trabalho ou contrários ao bem comum» (Catecismo da Igreja Católica, n.º 2435), recorda o referido Compêndio.

No número seguinte, indica-se que “o magistério reconhece o papel fundamental cumprido pelos sindicatos dos trabalhadores, cuja razão de ser consiste no direito dos trabalhadores a formar associações ou uniões para defender os interesses vitais dos homens empregados nas várias profissões”.

João Paulo II, na sua encíclica sobre o trabalho, indicava que os sindicatos “cresceram a partir da luta dos trabalhadores, do mundo do trabalho e, sobretudo, dos trabalhadores da indústria, esforçando-se pela defesa dos seus justos direitos, em confronto com os empresários e os proprietários dos meios de produção” (Laborem Exercens, n.º 20).

Para a Igreja Católica, as organizações sindicais, “perseguindo o seu fim específico ao serviço do bem comum, são um factor construtivo de ordem social e de solidariedade e, portanto, um elemento indispensável da vida social”.

“O reconhecimento dos direitos do trabalho constitui desde sempre um problema de difícil solução, porque se actua no interior de processos históricos e institucionais complexos, e ainda hoje pode considerar-se incompleto. Isto torna mais que nunca actual e necessário o exercício de uma autêntica solidariedade entre os trabalhadores”, assinala o Compêndio da Doutrina Social.

Para a Igreja Católica, as relações no interior do mundo do trabalho devem ser “caracterizadas pela colaboração: o ódio e a luta para eliminar o outro constituem métodos de todo inaceitáveis, mesmo porque, em todo o sistema social, são indispensáveis para o processo de produção tanto o trabalho quanto o capital.

À luz desta concepção, a doutrina social «não pensa que os sindicatos sejam somente o reflexo de uma estrutura “de classe” da sociedade, como não pensa que sejam o expoente de uma luta de classe, que inevitavelmente governe a vida social» (Laborem Exercens, n.º 20).

Os sindicatos são propriamente os promotores da luta pela justiça social, pelos direitos dos homens do trabalho, nas suas específicas profissões: «Esta “luta” deve ser compreendida como um compromisso normal das pessoas a “favor” do bem justo […]; mas não uma luta “contra” os outros» (Laborem Exercens, n.º 20).

O Catecismo da Igreja, no seu número 2430, precisa que o sindicato, sendo antes de tudo instrumento de solidariedade e de justiça, não pode abusar dos instrumentos de luta; em razão da sua vocação, deve vencer as tentações do corporativismo, saber auto-regular-se e avaliar as consequências das próprias opções em relação ao horizonte do bem comum.

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