terça-feira, 16 de novembro de 2010

Deus na poesia e poesia de Deus


Na Mão de Deus

Na mão de Deus, na sua mão direita,
Descansou afinal meu coração.
Do palácio encantado da Ilusão
Desci a passo e passo a escada estreita.

Como as flores mortais, com que se enfeita
A ignorância infantil, despojo vão,
Depois do Ideal e da Paixão
A forma transitória e imperfeita.

Como criança, em lôbrega jornada,
Que a mãe leva ao colo agasalhada
E atravessa, sorrindo vagamente,

Selvas, mares, areias do deserto...
Dorme o teu sono, coração liberto,
Dorme na mão de Deus eternamente!
Antero de Quental, in "Sonetos"

O NADA DE DEUS

Torna-te como criança:
faz-te surdo e cego!
Torna-te nómada,
atravessa o que é ser,
e o que é nada!
Abandona o lugar,
abandona o tempo
abandona as imagens.
Se seguires sem destino
pelo trilho estreito
alcançarás o centro deserto.

Ó minh'alma
sai para fora, Deus entra!
Funde todo o teu ser
no nada de Deus.
Derrama-te no caudal sem fundo!
Se saio de ti
tu vens até mim.
Se me perco
é a ti que encontro.
Oh quem pudesse medir a tua vastidão!
Eckart, tradução de Tolentino Mendonça.

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