terça-feira, 10 de agosto de 2010

OS GESTOS NA LITURGIA

Falar de gestualidade litúrgica é lembrar-nos de que a nossa natureza humana tem e se exprime "num corpo".
A gestualidade funda-se biblicamente numa experiência vital de Deus. Hoje para os cristãos esta experiência vital dá-se no interior da comunidade eclesial e na celebração dos sacramentos.
O gesto coloca o corpo em oração, como pessoa inteira. Com a renovação litúrgica foi reencontrada «a nobre simplicidade dos ritos» (Constituição Litúrgica Sacrosanctum Concilium, n.° 34).
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O gesto é um acto que exprime um estado interior da pessoa. Os gestos na liturgia estão modelados segundo os próprios gestos que Cristo usou. O fundamento dos gestos é o próprio Cristo. Ao pensarmos n'Ele favorece-se o nível máximo de interiorização. Ele assumiu a dimensão da corporei­dade humana, tornando-Se assim a referência de toda a gestualidade litúrgica.
Narra-nos a Carta aos Hebreus (10,5): «Entrando no mundo, Cristo disse: não quisestes sacrifício nem oblação, mas preparaste-Me um corpo.» É deste núcleo que deriva todo o posterior gesto litúrgico, porque a nossa espiritualidade litúrgica deve ser modelada e orientada sobre a gestualidade de Cristo. Assim, quando rezamos, tentamos imitar todos os gestos corporais da vida de Cristo, que foram muitos e vêm descritos no Evangelho, dando realce especial à Sua "paixão", durante a qual «Ele estendeu as mãos e morreu na cruz».

O sinal é algo sensível que significa ou indica outra realidade ausente ou presente, e informa e orienta.
O símbolo é uma linguagem muito mais expressiva e rica de co­notações do que simplesmente a falada. Tem uma função mediadora, comunicativa e unificadora. Apoia os fiéis na sua "procura" de Deus. Estabelece uma relação afectiva entre uma pessoa e a realidade pro­funda que não se consegue exprimir bem de outra forma. A liturgia e os costumes cristãos estão cheios de símbolos: a água para o baptismo, o pão para a Eucaristia, o vinho, o gesto de reconciliação, as palavras da absolvição e da consagração, a imposição das mãos, a bênção...
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A seguir descrevemos o significado de alguns gestos que aparecem na celebração eucarística — o sacramento "principal" (porque os sa­cramentos são mais diferentes do que iguais), mais conhecido.
De pé: é uma postura que significa a ressurreição de Cristo que se levantou do sepulcro, e que ganhou a liberdade para estar, conforme a sua promessa, em todas as assembleias cristãs. É sinal de atenção, adesão, respeito e disponibilidade. A lição do Evangelho ouve-se sempre "de pé".
De joelhos: traduz uma atitude de penitência, de humildade e de oração intensa. Recomenda-se para acompanhara Oração Eucarística, após a aclamação do "santo".
A genuflexão: é o gesto de dobrar o joelho direito até ao solo, com perfeição e na vertical. Indica respeito, reverência, adoração. Na Missa é feita pelo sacerdote 3 vezes: na ostensão do pão e do cálice consagrados e antes da Comunhão. Porém, todos os fiéis o devem fazer, com perfeição e calma, quando passam diante do SS.° Sacramento, diante do sacrário, e na procissão do Corpo de Deus. Genuflexões perfeitas são hoje em dia muito raras em Portugal, mas os santos faziam-nas perfeitíssimas, cheios de fé.
Sentados: é a postura de quem ensina com autoridade ou de quem escuta com atenção muito especial.
Beijo (Abraço da paz): na Missa é um rito antes da Comunhão. Significa concórdia, intimidade, união dos corações e dos ideais.
Sinal da Cruz: é uma profissão de fé baptismal, trinitária, identi­ficação com Cristo Crucificado.
Bater no peito: sinal de arrependimento e desejo de conversão. Usa-se no acto penitencial no início da Missa.
Mãos postas: muitos juntam-lhes também os olhos fechados. Significa intensidade, elevação, oração sincera, recolhida, elevador para a contemplação.
Estender os braços: imitação de Cristo que também estendeu os braços para morrer na Cruz.
Mãos abertas: louvor, petição, entrega e acolhimento dos dons de Deus.
Lava-mãos: sinal de purificação do pecado. Fá-lo o sacerdote antes de oferecer o sacrifício de Cristo e da Igreja.
Imposição das mãos: gesto bíblico muito antigo. Usa-se como epiclese (súplica ao Espírito Santo), para consagração de coisas e sobretudo de pessoas.
Elevação (a grande): é um gesto novo próprio da Missa, diferente da ostensão e colocado ao fim da Oração Eucarística, antes do Pai Nosso, quando o sacerdote eleva o pão e o vinho, mostrando-os aos fiéis e esperando que estes digam «Amen» em ratificação da oração sacerdotal. Sempre que o sacerdote presta atenção correcta a este rito, como é sua obrigação, revela uma sensível eclesiologia de admirar.
Fracção do pão: rito usado pelo próprio Cristo quando celebrava a Eucaristia. Simboliza o amor de entrega de Jesus por nós, e a paz e reconciliação que Ele nos adquiriu e em que nos colocou no decorrer da Santa Missa.
Silêncio: é um espaço em que Deus vive e Se manifesta. Cria o ambiente especialmente favorável ao encontro com Ele. Usa-se no espaço sagrado e todo o sacerdote o favorece antes das orações, na Comunhão e nas adorações eucarísticas.
Bênção: É "bem-dizer", primeiro a Deus; depois, Deus tem bênçãos espirituais em Cristo para os fiéis, e muitas bênçãos materiais para todas as criaturas.
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Tudo o que se faz e acontece na liturgia exige um entendimento. A catequese litúrgica torna-se cada vez mais necessária, e não admira que tenha sido inculcada pelo próprio Concílio Vaticano II. É uma maneira de se evitar "o adormecimento" ou "o aborrecimento" dos fiéis e de se exibir a "unidade" em Cristo de toda a comunidade cristã. Porque é que muitos em Portugal, especialmente os jovens, e muitos dos quais até costumam ir à Missa, dizem com facilidade que tudo isto «é uma "seca"»? — Isto apenas traduz o deserto laico, secularizante que hoje se vive. É o baixar dos braços, pior que um freio, à evangelização.
Há, porém, quem interprete a sua corporeidade precária, com todas as pobrezas que salienta (repetição, cansaço, doença, incomunicabilidade, medo, solidão e morte), como lugar histórico do triunfo de Cristo que vem, qual templo vivente, consagrado pelo Espírito do Filho enviado pelo Pai, ao qual suplicam com veemência: «Até quando; Senhor, Tu que és santo e veraz; até quando não virás para nos fazeres justiça?» (AP 6,10), e, porque se sente Esposa, diz com a voz do Espírito: «Vinde, Senhor Jesus» (AP 22,17.20). É assim que se descobre a profundidade das palavras de Tertuliano: caro salutis cardo (a carne é invólucro da salvação). Assim é, de facto, na "materialidade" dos sacramentos e na pluralidade dos gestos e sinais litúrgicos.
Pe. Mário Santos, Sacerdote Paulista
In Revista SÍNTESE

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