terça-feira, 26 de abril de 2011

EM LOUVOR DA FRAGILIDADE

1. Não sou, por natureza e formação, sensível às teorias da conspiração.

Não creio, por isso, que haja uma intenção deliberada de explorar as fragilidades da Igreja.

O que existe resulta de um desconforto quando não se assume, com humildade e transparência, a ocorrência dessas fragilidades.

O que subsiste é uma amargura diante da presunção de uma força que quase não admite falhas. É por isso que, quando estas são conhecidas, a tendência é para as explorar até à exaustão.

Sucede que, olhando para Jesus, a Igreja não tem motivos para vacilar diante da fragilidade.

A salvação assenta, por muito que isso nos desconcerte, num mistério de fragilidade.  

Trata-se de uma fragilidade inteiramente assumida, francamente exposta e abertamente oferecida.

Não percamos de vista que nem Jesus esconde a Sua fragilidade. Quando Se apresenta pronto para sofrer a morte, confessa que «a carne é fraca» (Mt 27, 41).


2. No fundo e como reconheceu Tony Blair, «ser humano é ser frágil».

Jesus não fez exibições de força. A Sua maior força radicou na capacidade de encarar a fraqueza e de estender a mão aos mais fracos.

A Igreja de Jesus não é formada pelos melhores, mas por pessoas que se dispõem a dar o seu melhor. 

O ensinamento de Jesus é precioso também a este propósito. Ele não pressiona nem exclui. A própria pecadora é acolhida. E, no último instante, o paraíso é franqueado a um ladrão.

Será que já nos apercebemos de que, como lembra subtilmente Timothy Radcliffe, o primeiro cristão a ir para o céu foi um ladrão?

 É claro que, desde o princípio, não foi fácil aceitar isto. Segundo um poema siríaco muito antigo, houve um anjo que tentou impedir que o bom ladrão entrasse no céu!

 Só que Aquele que veio chamar os pecadores (cf. Mc 2, 17) não iria deixar ninguém de lado, muito menos «aqueles cujas vidas são um caos».

A virtude não é a ausência de falhas nem a isenção de erros. Ela assenta num esforço de autocrítica. E configura uma permanente tentativa de superação.

A virtude não exclui a falha. Inclui, sim, o recomeço após todas as falhas.


3. É por isso que a exibição de virtude é pouco apreciada. Pressupõe uma superioridade que nem sempre encontra o devido enquadramento na vida.

 Acresce que um discurso que não tolere a falha tem, inevitavelmente, o efeito contrário: torna intolerável a falha de quem não tolera a falha.

O exibicionismo não é, ao contrário do que se possa pensar, uma forma de revelação. Acaba por ser um modo de encobrir. O problema é que, nos tempos que correm, torna-se cada vez mais difícil encobrir.

Um banho de humildade é sempre purificador. Uma certa animosidade para com a Igreja não está tanto nas falhas que nela ocorrem. Radica na pretensão (implicitamente sugerida) de que os seus membros são melhores.

 Nenhum exibicionismo aproxima de Cristo. E para quem se julga superior não deixe de pensar que foi um ladrão o primeiro cristão a subir ao Céu.


4. Tudo isto mostra que não é quando nos distanciamos do humano que nos aproximamos de Deus.

Pelo contrário, é quando aterramos na profundidade do humano que melhor tocamos o divino.

 Para Deus sobe-se descendo. Foi das profundidades da terra que Jesus irrompeu para Deus.

Divino, a partir de Cristo, não é, pois, a distância ontologicamente intransponível entre Deus e o Homem.

 O divino está também no humano que se transcende, no humano que se dá, no humano que se entrega.

 Haverá algo mais divino do que a humanidade doada de Jesus?
Fonte: aqui

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