sábado, 6 de novembro de 2021

O velho pároco e o pai de 12 filhos - Testemunho de um padre

 “No dia da minha missa nova, o padre que tinha casado os meus pais e tinha batizado boa parte dos meus irmãos, já não era nosso pároco. Mas foi convidado e fez questão de me ir saudar, na minha casa de família. Na varanda, enquanto se ultimavam os preparativos da longa procissão para a Igreja, ele partilhou comigo esta cena da sua vida pastoral: «Quando pensei pôr bancos na Igreja, resolvi, no final da missa, perguntar aos fiéis: ‘Quem pode dar uma ajuda?’, ‘Quanto poderia cada família dar’? O teu pai – disse-me o Pe. Manuel Gonçalves – foi o primeiro a responder: ‘Eu, por mim, pago um banco inteiro’». Retorquiu o pároco de então: “Manel, tu não podes. É muito. Tens 12 filhos”. Meu pai respondera então: “Eles em casa também não se sentam no chão. Pago um banco, sim senhor; é a minha obrigação”. Perante a resposta do meu pai – confessou o velho pároco – “os outros todos sentiram-se na obrigação de dar, na mesma medida, e arranjámos o dinheiro que era preciso. Todos perceberam que a Igreja era também a sua Casa”. Esta história comoveu-me muito, mas ela repetia-se amiúde lá em casa: primeiro, dar o que é preciso para a Igreja, para as festas da paróquia, para os pobres da freguesia… só depois, se sobrasse alguma coisa, podíamos reclamar os nossos luxos: umas meias novas ou umas botas novas. A minha mãe, às vezes dia: “Manel, estás a dar muito. Olha que…”. O meu pai, que era bom em contas, respondia: “Rita, ele sai pela porta e entra pela janela”. Conto-vos estas coisas, porque o exemplo do meu pai deu-me um grande sentido de partilha, de amor à Igreja, deu-me a consciência da Igreja como Casa de família, a importância da sobriedade de vida, da preocupação com os pobres, a certeza de não valer a pena dar nada se não se der tudo. Podia ainda lembrar duas viúvas, que, no tempo de seminário, a primeira coisa que faziam, quando recebiam a sua pequeníssima reforma, era darem-me alguma coisa, em troca de umas ave-marias, antes que o dinheiro desaparecesse!”

Amaro Gonçalo Ferreira Lopes

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