Volto aqui às minhas recolhas, que há mais de meio século obtive, junto de camponeses com certa idade analfabetos e com muita tarimba. Liam com a maior facilidade os efeitos do vento e sabiam os melhores resultados que podiam tirar dos quartos da Lua. O crescente e o minguante eram aqueles que eram mais esperados para os trabalhos agrícolas. Embora tivessem essa faculdade, não conseguiam controlar o clima, cujos fenómenos daí resultantes, até hoje ainda ninguém conseguiu mexer ou adaptar ao melhor sucesso, por mais que a ciência se esforce na Física do Clima, o que viria a trazer um benefício Global.Daí que as calamidades climáticas fossem sempre o pior fator para a produção agrícola deste país. Mais concretamente o gelo, pois se o mesmo através de acentuado arrefecimento noturno, queima os renovos, em precipitação, o denominado granizo e no último terço da primavera, destrói tudo aquilo que garantia uma boa colheita, juntamente com tantos litros de suor humano, bem como larga litragem de gasóleo que fez movimentar a maquinaria agrícola a fim de colocar as sementeiras e as plantações em adiantado estado de desenvolvimento. É bem evidente que são os frutos os que mais sofrem, pois estão a céu aberto, enquanto que os produtos criados na terra como a batata e a cebola têm outra proteção. Como naquele tempo a iliteracia abundava por demais no espaço rural, no tempo em que me refiro, os saberes iam passando de boca em boa, na maioria das vezes em forma de adágio rimado para que não fosse tão vulnerável ao esquecimento. Essas sentenças populares tornavam-se verdadeiras regras na condução agrícola, a menos que a meteorologia o não permitisse. No tempo em que estamos a viver, há um desses ditados que assenta perfeitamente. Eu há várias dúzias de anos que ouvia dizer: - Ano bissexto, ano travesso. Tudo isto quer dizer que nesta ou naquela área, o vinte e nove de fevereiro traz turbulência. Já não tenho memória dos outros catorze que a vida me deu, mas confesso que no meu ponto de vista varreu com a desgraça todos os setores da vida portuguesa. No aspeto pandémico, foi mesmo o mundo inteiro. Por cá não deixou nada de pé, todas as atividades económicas foram afetadas gravemente devido à pandemia. A par disso e dos confinamentos que daí resultaram colocaram os vários serviços num caos. O setor da saúde ficou completamente baralhado não se sabendo quantos morreram ao certo, nem nunca se virá a saber, quantos morreram por falta de assistência, noutras patologias dado que toda a medicina foi canalizada para o combate ao Covid-19.Em algumas áreas do país as trovoadas desfizeram toda a agricultura, dizimando não só a fruta como os rebento que viriam a servir nos anos seguinte, tudo isto devido a saraivadas violentas que tudo atingiram. Para além disso vem um tempo húmido a seguir a uns dias de calor que impede de se enfardar e recolher alguns fenos que já se encontravam tombados. Tudo isto sem falar no nevão primaveril de trinta e um de março, que molestou toda a fruta mais precoce. Pela minha análise, não tenho receio em afirmar que o quinto ano bissexto deste milénio, foi até agora e continuará a ser, um ano mesmo mau. Ora em algumas conversas em que às vezes se foca os danos que a natureza nos tem trazido, eu vou buscar o ditado e então passo a sentenciar a desgraça com o dito provérbio que me ficou em mente desde miúdo, que por vezes dá uma certa graça, sem que seja contrariado. Ora há poucos dias, estava eu em conversa com uma figura pública do país, na área das cantigas que também tinha queixas do que lhe acontecia este ano em vários aspetos Eu em conversa amena lá dei o meu despacho: - Ano bissexto, ano travesso! Vem-me de volta uma resposta sábia: - Então Deus que o marcou, algum defeito lhe encontrou.
José Albano, "A Guarda"
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