Papa afirma que a Igreja «não tem soluções globais a propor», mas oferece «o seu testemunho e gestos de partilha»
O Papa Francisco, na sua mensagem para o IV Dia Mundial dos Pobres, afirma que o imperativo ‘Estende a tua mão ao pobre’ é “condição da autenticidade da fé”.
“Manter o olhar voltado para o pobre é difícil, mas tão necessário para imprimir a justa direção à nossa vida pessoal e social. Não se trata de gastar muitas palavras, mas antes de comprometer concretamente a vida, impelidos pela caridade divina. Todos os anos, com o Dia Mundial dos Pobres, volto a esta realidade fundamental para a vida da Igreja, porque os pobres estão e sempre estarão connosco para nos ajudar a acolher a companhia de Cristo na existência do dia a dia”, escreveu Francisco, numa mensagem divulgada hoje pela Sala de Imprensa da Santa Sé.
O Papa indica que o encontro com uma pessoa em condições de pobreza não pode parar de “provocar e questionar”: “Como podemos contribuir para eliminar ou pelo menos aliviar a sua marginalização e o seu sofrimento? Como podemos ajudá-la na sua pobreza espiritual?”.
Desde 2017, a celebração promovida por Francisco quer colocar a pessoa em situação de pobreza no centro do agir da Igreja; este ano a mensagem para a celebração, no dia 15 de novembro, está envolva no contexto da pandemia de Covid-19.
O período da pandemia constrangeu-nos a um isolamento forçado, impedindo-nos até de poder consolar e estar junto de amigos e conhecidos atribulados com a perda dos seus entes queridos. Experimentamos a impossibilidade de estar junto de quem sofre e, ao mesmo tempo, tomamos consciência da fragilidade da nossa existência”.
Além da dificuldade, evidencia Francisco, estes meses mostram que “estender a mão é um sinal que apela imediatamente à proximidade, à solidariedade, ao amor” e que, apesar da “malvadez e a violência, a prepotência e a corrupção”, a vida está “tecida por atos de respeito e generosidade que não só compensam o mal, mas impelem a ultrapassá-lo permanecendo cheios de esperança”.
“Nestes meses, em que o mundo inteiro foi dominado por um vírus que trouxe dor e morte, desconforto e perplexidade, pudemos ver tantas mãos estendidas! A mão estendida do médico que se preocupa de cada paciente, procurando encontrar o remédio certo”, pode ler-se.
O Papa presta homenagem a todas as mãos que “desafiaram o contágio e o medo, a fim de dar apoio e consolação”.
A mão estendida da enfermeira e do enfermeiro que permanece, muito para além dos seus horários de trabalho, a cuidar dos doentes. A mão estendida de quem trabalha na administração e providencia os meios para salvar o maior número possível de vidas. A mão estendida do farmacêutico exposto a inúmeros pedidos num arriscado contacto com as pessoas. A mão estendida do sacerdote que, com o coração partido, continua a abençoar. A mão estendida do voluntário que socorre quem mora na rua e a quantos, embora possuindo um teto, não têm nada para comer. A mão estendida de homens e mulheres que trabalham para prestar serviços essenciais e segurança”.
O Papa Francisco afirma que a Igreja “não tem soluções globais a propor”, mas procura oferecer “o seu testemunho e gestos de partilha”, sentindo-se “obrigada” a evidenciar os pedidos de “quantos não têm o necessário para viver”, lembrando, assim, que “o grande valor do bem comum é, para o povo cristão, um compromisso vital, que se concretiza na tentativa de não esquecer nenhum daqueles cuja humanidade é violada nas suas necessidades fundamentais”.
O texto alerta que as “graves crises económicas, financeiras e políticas não cessarão” enquanto cada um não “assumir os pesos dos mais vulneráveis”.
A generosidade de apoiar “o vulnerável”, consolar o aflito, “mitigar sofrimentos”, refere Francisco, “devolve dignidade a quem dela está privado, é condição para uma vida plenamente humana”, que “não pode estar condicionada pelo tempo disponível ou por interesses privados, nem por projetos pastorais ou sociais desencarnados”.
“Não se pode sufocar a força da graça de Deus pela tendência narcisista de se colocar sempre a si mesmo no primeiro lugar”, sublinha.
O Papa Francisco critica, em contraste com o “estender a mão ao pobre”, quem “conserva as mãos nos bolsos e não se deixa comover pela pobreza, da qual frequentemente é cúmplice”.
“Existem mãos estendidas para premir rapidamente o teclado de um computador e deslocar somas de dinheiro duma parte do mundo para outra, decretando a riqueza de restritas oligarquias e a miséria de multidões ou a falência de nações inteiras”, acrescenta.
Há mãos estendidas a acumular dinheiro com a venda de armas que outras mãos, incluindo mãos de crianças, utilizarão para semear morte e pobreza. Existem mãos estendidas que, na sombra, trocam doses de morte para se enriquecer e viver no luxo e num efémero desregramento. Existem mãos estendidas que às escondidas trocam favores ilegais para um lucro fácil e corrupto. E há também mãos estendidas que, numa hipócrita respeitabilidade, estabelecem leis que eles mesmos não observam”.
O Papa defende que a comunidade cristã tem de ser chamada a “coenvolver-se na experiência de partilha, ciente de que não é lícito delegá-la a outros”.
“O clamor silencioso de tantos pobres deve encontrar o povo de Deus na vanguarda, sempre e em toda parte, para lhes dar voz, defendê-los e solidarizar-se com eles face a tanta hipocrisia e tantas promessas não cumpridas, e para os convidar a participar na vida da comunidade”, indica.
O Papa afirma que oração e solidariedade com os “pobres e enfermos” são “inseparáveis” e que para celebrar “um culto agradável a Deus”, “é preciso reconhecer que toda a pessoa, mesmo a mais indigente e desprezada, traz gravada em si mesma a imagem de Deus”.
“O objetivo de cada ação nossa só pode ser o amor: tal é o objetivo para onde caminhamos, e nada deve distrair-nos dele. Este amor é partilha, dedicação e serviço, mas começa pela descoberta de que primeiro fomos nós amados e despertados para o amor”, escreve.
In Agência Ecclesia
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